sábado, 6 de setembro de 2014

Independência sem justiça social: o paradoxo histórico que persiste - uma nota para reflexão

Na última sexta-feira (05/09/2014), dezenas de crianças de nossa terra do açaí foram levadas por suas escolas às ruas, para desfilarem em comemoração à chamada Semana da Pátria. Entre esses pequeninos também caminhou minha filha Maria Clara, de 06 anos.

Indiscutivelmente estão de parabéns todos os profissionais da educação pública de Igarapé-Miri pelos valorosos esforços disponibilizados em prol desse projeto de educação cívica (a Semana), traduzido em estudos, reflexões e debates nas escolas e nas apresentações públicas como forma de celebração.
Por coincidência, no mesmo instante em que Maria Clara experimentava aquela festa, embora ainda não muito consciente dos significados e dos contrassensos imbricados nesse ato, eu acompanhava, na UNICAMP (portanto, muito distante daqui), uma importante discussão sobre os esforços que estão sendo feitos pela Comissão Nacional da Verdade e suas congêneres para revelar ao Brasil as verdades sobre o vergonhoso período da repressão imposta pelo estado brasileiro e recomendar medidas pelas quais se possa fazer justiça e reparar parte dos muitos danos a que foram submetidas centenas de famílias.

Pasmem os senhores, aquele debate mostrou que em diferentes partes do pais os casos de repressão e injustiças, por isso crime contra a pessoa, continuam sendo praticados por agentes estatais, embora já tenha sido declarado oficialmente o fim da ditadura. Tais evidências me fizeram lembrar da realidade paraense, em especial de alguns municípios dos quais tenho informações incontestes.

Em um deles, pertence à Região Sul do Pará, o prefeito comanda um grupo de capangas que cumprem ordens para reprimir “adversários políticos” de Sua Excelência, sempre que este se sente desafiado. Há relatos de que o gestor e seus comparsas já expulsaram grupos de manifestantes na cidade com uso de arma de fogo. Numa cidade próxima a esta citada, o secretário de educação jurou (e tem feito todos os esforços para) acabar com uma turma de graduação recentemente implantada no município dele apenas porque as inscrições dos candidatos “não passaram pelas mãos” do executivo.

É curioso que os métodos são bastantes parecidos, conforme pude observar nas exposições: ameaças, agressões, imposição da cultura do silêncio, extermínios... Uma narrativa que a mim pareceu muito familiar.

Pois bem, antes que me perguntem: e qual a relação desse fenômeno com a semana da prática? Eu adianto: tudo! Penso que esse momento de reflexão sobre a cidadania de um povo deve ser tomado (também) como uma oportunidade para nos questionarmos acerca do valor da democracia, da justiça, da inalienabilidade dos direitos humanos (isto é, todos os direitos). Daí a importância de estimular em nossas crianças – além do gosto pela comemoração, pela celebração popular – a curiosidade sociológica, de tal forma que possamos, a partir dessas novas gerações, incidir de modo mais qualificado na construção do lugar onde vivemos.

Digo isso para afirmar que um estágio de independência plena só pode ser alcançado por meio de duas grandes revoluções: uma na educação, notadamente no que tange à formação de sujeitos questionadores e construtores do bem viver. E, outra, que ofereça condições para o desenvolvimento econômico, não a qualquer preço, mas aquele que gera qualidade de vida com justiça social, civilização cuja dinâmica não permite nenhum tipo de violência.

Eu conversarei com a Maria Clara sobre essas coisas, tão logo ela as compreenda. Que tal debate-las com outros estudantes que já possuem condições intelectuais para tanto?      

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